Desigualdade social e esquizofrenia: aumento da incidência de esquizofrenia em países com altos níveis de desigualdade social




Texto de Dr. Lucas Hortêncio

A esquizofrenia é sem sombra de dúvidas um dos transtornos que mais atraiu atenção de estudiosos desde o início da história da Psiquiatria. Não poderia ser diferente no caso de um transtorno que pode cursar com grandes perdas funcionais, grave apresentação psicopatológica e que infelizmente ainda é alvo de estigma e preconceito.

Desde as primeiras conceituações do transtorno, a ideia de uma origem essencialmente biológica, entendida por muitos por genética, sempre esteve presente, corrente defendida especialmente com Emil Kraepelin. Apesar de proposições em contrário, esta visão dominou boa parte da pesquisa e prática psiquiátrica nas últimas décadas. Sua má interpretação, no entanto, levou a ideia errônea de que fatores ambientais teriam pouco impacto no desenvolvimento da esquizofrenia, o que acarretaria em uma prevalência quase universal do transtorno.

Apesar de já ter sido desmentida há décadas, este conceito permanece na mente de vários profissionais que não raro retomam o dogma de que a prevalência da esquizofrenia é fixa e aproximadamente 1%. Diversos trabalhos mostraram que fatores ambientais tem associação com o risco para desenvolvimento da doença e consequentemente com sua prevalência em dada população.

Os itens associados são os mais diversos: abuso de substâncias, abuso na infância, má assistência ao parto, baixa escolaridade, baixo quociente intelectual, pobreza, imigração, violência domiciliar. É evidente que a relação que cada um destes fatores estabelece com o desenvolvimento do transtorno ainda não está clara mas há evidência de impactos por vias psicológicas, epigenéticas e de desregulação neuronal.

Um exemplo bastante interessante é um estudo de 2014 publicado por Burns e colaboradores. Os autores analisam a relação entre prevalência de esquizofrenia e a desigualdade social de diversos países, quantificada pelo Coeficiente de Gini. A conclusão é que países com maior desigualdade social apresentam maior risco para esquizofrenia, mesmo quando se controla para outros fatores de risco como pobreza.



O trabalho é de livre circulação e vale a pena conhecer: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4105302/

Comentários

Postagens mais visitadas