A importância das intervenções psicossociais e a esquizofrenia

Arlete Modelli

Sabemos que o diagnóstico de esquizofrenia carrega consigo um grande peso.
Começando pela sintomatologia, que se configura de forma complexa apresentando
sintomas positivos (delírios e alucinações), desorganização do pensamento, sintomas
negativos (embotamento afetivo, retraimento social, anedonia e diminuição da
iniciativa e energia), ás vezes depressão ou excitação maníaca e perda da capacidade
de abstração, comprometimento da memória e das funções executivas. (Kahn et al.,
2015) Tal descrição, já aponta uma enorme mudança na vida de uma pessoa que
venha a sofrer alguns desses sintomas.
Na maior parte das vezes reconhecer qualquer um desses sintomas requer um certo
tempo. A chamada fase prodômica com relatos de declínio no funcionamento cognitivo
e social é considerada muitas vezes como uma fase da adolescência, um período
ruim, um momento de transição na vida, período que se evita qualquer busca de
ajuda. Entretanto, é posterior a “esse aviso” que pode ocorrer o primeiro surto
psicótico.
A consequência desse primeiro surto pode ser a remissão completa ou a necessidade
de cuidados. Considerada uma doença crônica, pode levar o individuo a prejuízos em
vários domínios da vida diária, como habilidade em manter os relacionamentos
sociais, manter-se no emprego ou conseguir um, bem como estudar e manter uma
vida independente.
Nos últimos anos tem-se compreendido de forma diferente a evolução da
esquizofrenia. Kraepelin (1919/1971) em seus estudos reconhece uma série de
sintomas e evolução dando o nome de “demência precoce”, sendo sua evolução a
incapacidade. Com Bleuler (1911) e outros pesquisadores altera-se o nome de
demência precoce para esquizofrenia, reconhecendo e considerando outros
prognósticos menos catastróficos. . Nesse sentido, vários estudos tem se debruçado e
identificado que as causas podem estar para além dos achados biológicos e
genéticos, considerando relevante a história do individuo, a epigenética ganha
dimensão.
Nessa esteira, a partir da luta anti-manicomial, se reconhece que aquele que sofre do
transtorno é um individuo que tem direitos, bem como uma história. É assim que inicia

a possibilidade de dar voz aos relatos sobre sua doença e da forma como entende seu
tratamento e suas dificuldades. Vários são os estudos baseados em evidencias que
tratam não só a evolução da doença a partir do uso dos medicamentos, mas a ênfase
nos tratamentos psicossoais, reconhecendo as necessidades dos pacientes frente às
consequências do transtorno. (Mueser et al, 2013)
Corroborando com essa ideia, o manual “Understanding Psychosis and Schizophrenia”
(Cooke, A. 2000) trata de inúmeros pontos sobre a psicose e esquizofrenia pelo olhar
psicológico. Partimos da consideração de que falar é vital ao Homem e também vital
aquele que sofre de uma doença mental. Assim, é importante que o paciente possa,
através da fala, expressar suas experiências com a doença sem julgamento. Nesse
sentido, o profissional de saúde mental, deve ouvir, sendo essa uma das primeiras
formas de ajudar. Através da fala o paciente pode vir a entender suas experiências,
descobrir o que elas significam e descobrir o que ajuda. A ideia de que é possível
compreender psicologicamente experiências psicóticas - em outras palavras, da
mesma forma que entendemos outras experiências humanas – permite a
transformação dos atendimentos dos serviços de saúde mental.
Nesse sentido, a maneira que a fala se apresenta não tem formato único, todas são
bem vindas e se mostram importantes em cada etapa da doença: pode ser pelos
grupos psicoeducativos, na reabilitação cognitiva, pelas terapias cognitivas
comportamentais para psicose, pela psicanálise, pelos grupos de apoio a educação e
emprego. O que vem se segmentando é que permitir que o sujeito que sofre, e
também seu familiar, o direito a falar e trocar experiências, vem sinalizado pontos
positivos no acesso a melhor qualidade de vida, no reconhecimento de um “jeito de
ser” e uma forma de autonomia. O que significa que, além dos medicamentos, a oferta
ampla e diversificada de várias formas de intervenções são cada vez mais
reconhecida como importante na melhora do prognóstico. (Dewan, 2018; Kane, J. M.,
et al, 2017; Karniol, 2000; Mueser, et al., 2013; Ontario, 2018)

Referencia Bibliográfica
Bleuler, E. (1911) 'Dementia Praecox ou o Grupo das Esquizofrenias' edição
portuguesa Climepsi editores, 2005, Lisboa
Cooke, A. Understanding Psychosis and Schizophrenia: Why people sometimes hear
voices, believe things that others find strange, or appear out of touch with reality, and
what can help. A report by the Division of Clinical Psychology, 2000
Dewan M.J., The Psychology of Schizophrenia: Implications for Biological and,
Psychotherapeutic Treatments. The Journal of Nervous and Mental Disease • Volume
204, Number 8, August 2016
Kahn RS, Sommer IE, Murray RM, Meyer-Lindenberg A, Weinberger DR, Cannon TD,
O'Donovan M, Correll CU, Kane JM, van Os J, Insel TR. Schizophrenia. Nat Rev Dis
Primers. 2015;1:15067.
Kane, J. M., et al. Comprehensive Versus Usual Community Care For First Episode
Psychosis: Two-Year Outcomes From The NIMH RAISE Early Treatment Program. Am
J Psychiatry. Author manuscript; available in PMC 2017 April 01
Karniol, I. G. Psicanálise na esquizofrenia. Rev Bras Psiquiatr 2000;22(3):147-8
Kraepelin E. 1919/1971. Dementia Praecox and Paraphrenia. New York: Krieger
Ontario Health Technology Assessment Series; Vol. 18: No. 5, pp. 1–141, October
2018
Mueser, K.T.; Deavers, F.;Penn, D.. l. and Cassisi, J. E. Psychosocial Treatments for
Schizophrenia. Annu. Rev. Clin. Psychol. 2013. 9:465–97

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